CAPACITAÇÃO, QUALIFICAÇÃO, HABILITAÇÃO E AUTORIZAÇÃO
Considerações sobre o Item 10.8 da NR-10

De acordo com a NR-10, somente profissionais autorizados pela empresa podem adentrar em zona controlada não segregada (ponto 31 do glossário). Mas quem são os profissionais que podem receber essa autorização? A própria Norma responde:

“São considerados autorizados os trabalhadores qualificados ou capacitados e os profissionais habilitados, com anuência formal da empresa.” - Subitem 10.8.4 da NR-10.

Portanto, somente profissionais capacitados, qualificados ou habilitados podem ser autorizados a entrarem numa zona controlada.

Mas quem são realmente os profissionais que podem receber status de “capacitados”, “qualificados” e “habilitados” para que possam ser “autorizados” pela empresa?

De forma resumida, pode-se definir as três categorias da seguinte maneira:

Capacitado: é aquele trabalhador envolvido com trabalhos em eletricidade que não teve uma formação em instituição de ensino oficial, mas que devido aos conhecimentos e habilidades adquiridos no cotidiano laboral pode receber um treinamento formal* da empresa onde trabalham, e recebem a denominação de profissional capacitado.

Qualificado: é aquele profissional da área elétrica que recebeu uma formação teórica e prática numa instituição de ensino oficial, a exemplo de CEFET e SENAI. Ele deve possuir o diploma de conclusão do curso.

Habilitado: é o qualificado que se dirige ao seu Conselho de classe e solicita o registro profissional. Ao receber a carteira de associado passa a ter habilitação em sua área de atuação. Naturalmente, isso não significa necessariamente que sua experiência é maior que a de um trabalhador capacitado com muitos anos de experiência. Entretanto, este último não pode ser chamado de habilitado.

* Quando se diz aqui que o capacitado deve receber um "treinamento formal" significa apenas que deve ser uma formação com carga horária e conteúdo definidos, devidamente documentada pela empresa. Não significa uma educação formal em instituição de ensino oficial. Somente os qualificados receberam essa formação.

São os profissionais acima que podem receber autorização para trabalharem no sistema elétrico, especialmente o sistema elétrico de potência. Quaisquer outros se enquadram no seguinte item da norma:

“Os trabalhadores com atividades não relacionadas às instalações elétricas desenvolvidas em zona livre e na vizinhança da zona controlada, conforme define esta NR, devem ser instruídos formalmente com conhecimentos que permitam identificar e avaliar seus possíveis riscos e adotar as precauções cabíveis.” – Item 10.8.9, negritos acrescentados.

Se enquadram nessa definição pedreiros, serventes, pintores, zeladores, faxineiros etc. O treinamento a que devem ser submetidos não se restringe a algumas instruções rápidas dadas antes do serviço. Deve realmente ser uma instrução formal, conforme o sentido preciso que o dicionário dá a esta palavra. Essa instrução formal a que se refere a norma não obrigatoriamente é o curso de NR-10. A própria empresa na qual trabalha o colaborador pode ministrar um treinamento específico. Uma vez finalizado, o trabalhador tem permissão para executar atividades próximo à zona controlada, mas nunca dentro dela!

É importante mencionar que esse treinamento dado a pedreiros e pintores não é a “capacitação” que a norma define no item 10.8, pois esta é uma capacitação de âmbito técnico e profissional, não de segurança. Nem mesmo o curso de NR-10 torna alguém capacitado. Os que já são capacitados é que estão aptos a fazer o curso de NR-10, cujo enfoque é unicamente a segurança, nada mais. É sob essa perspectiva que diversas empresas de segurança em eletricidade colocam a situação, conforme pode ser visto nos exemplos abaixo:

“Norma NR-10 exige curso de capacitação.”

“[Objetivo do curso:] Propiciar ao aluno capacitado condição para obtenção da autorização para desenvolver Serviços em Instalações Elétricas.”

“[A NR-10] é destinada a profissionais capacitados e habilitados que exercem atividades ligadas a serviços de instalações elétricas.”

O especialista João Gilberto Cunha (ex-professor do ITA e coordenador na ABNT) define o profissional capacitado da seguinte maneira:

"Para os profissionais não qualificados, isto é, sem educação técnica formal (em curso reconhecido pelo Sistema Oficial de Ensino), a NR-10 criou a possibilidade de um treinamento técnico informal (em cursos sem reconhecimento do Sistema Oficial de Ensino) realizado sob a responsabilidade da empresa." – NR-10 Comentada (2011), de João Gilberto Cunha, negritos acrescentados, pp. 87, 88, São José dos Campos, São Paulo.

Portanto, é bom ter cuidado ao ver sites na Internet que usam a expressão “curso de capacitação em NR-10”. Para evitar confusão, essa colocação deveria ser evitada, para não induzir ao entendimento errôneo de que a capacitação mencionada na NR-10 é o curso de NR-10 em si, pois não é. É claro que quem passou por um treinamento de segurança está, por assim dizer, capacitado para trabalhar de forma segura. Mas esse “capacitado” não é o que se menciona no item 10.8. É tanto que quando a norma se refere a si mesma ela usa a expressão "Treinamento" em Segurança, e não "Capacitação" em Segurança.

Alguns fazem confusão talvez devido ao fato da norma não fornecer uma definição mais detalhada sobre quem são os profissionais capacitados e aqueles que podem trabalhar na vizinhança da zona controlada. No entanto, quando se lê determinados trechos do texto normativo, pode-se chegar à conclusão correta sobre essas definições. Por exemplo, ao mencionar os profissionais que podem ser autorizados a intervir em instalações elétricas, a norma diz:

“A empresa concederá autorização na forma desta NR aos trabalhadores capacitados ou qualificados e aos profissionais habilitados que tenham participado com avaliação e aproveitamento satisfatórios dos cursos constantes do ANEXO III desta NR.” – Item 10.8.8.1.

O anexo III se refere aos treinamentos de segurança necessários (NR-10 básico e Sistema Elétrico de Potência). Dentro da declaração acima, há três afirmações. Ao se separar cada uma delas, é possível perceber que esses cursos de segurança são destinados aos que já são capacitados, qualificados ou habilitados. Para confirmar isso, leia cada uma das três afirmações separadamente:

A empresa concederá autorização aos trabalhadores capacitados que tenham participado dos cursos constantes do ANEXO III

A empresa concederá autorização aos trabalhadores qualificados que tenham participado dos cursos constantes do ANEXO III

A empresa concederá autorização aos trabalhadores habilitados que tenham participado dos cursos constantes do ANEXO III

Para visualizar de outra maneira, você pode trocar qualquer uma dessas categorias por uma profissão específica:

A empresa concederá autorização aos eletrotécnicos que tenham participado dos cursos constantes do ANEXO III

Os eletrotécnicos que não tenham participado dos cursos deixam de ser eletrotécnicos? Claro que não. Eles não se tornaram eletrotécnicos porque fizeram os cursos do anexo III, mas sim porque passaram por uma escola. Da mesma maneira, o capacitado não se tornou capacitado por ter participado dos cursos do anexo III. Mas ele só receberá a autorização mencionada no subitem 10.8.8.1 se participar de tais cursos, além de ter que se submeter a um exame de saúde compatível com a atividade, conforme indicado previamente no 10.8.7. O mesmo acontece com os profissionais qualificados e habilitados. Eles recebem essa classificação porque fizeram um curso técnico ou de graduação, e possuem um registro no conselho de classe, respectivamente, conforme definido pela norma:

“É considerado profissional legalmente habilitado o trabalhador previamente qualificado e com registro no competente conselho de classe.” – Item 10.8.2 da NR-10.

Obras de referência na área de segurança mencionam justamente esse entendimento. Por exemplo, o livro Normas Regulamentadoras Comentadas, organizado por Giovanni Moraes de Araújo, afirma:

“Comprovada a qualificação ou capacitação, todos deverão realizar um curso básico de segurança em instalações e serviços em eletricidade [NR-10].” - colchetes acrescentados, p. 306.

“Aqueles que atuam em sistemas elétricos de potência, depois de aprovados no curso básico, deverão passar por um curso complementar [SEP].” - colchetes acrescentados, p. 306.

“Estes cursos não têm como objetivo fornecer subsídios técnicos de instalações elétricas, nem de servir de elemento de capacitação.” – negrito acrescentado, p. 306.

Na página 308, o livro ainda possui o seguinte diagrama:

Note, por exemplo, que a capacitação se dá na empresa e que o treinamento de segurança (NR-10) ocorre somente num momento posterior do histórico profissional do trabalhador.

Um outro exemplo é o livro "Legislação Comentada", da Federação das Indústrias do Estado da Bahia, que diz:

"Comprovada a qualificação ou capacitação, todos deverão realizar um curso básico de segurança em instalações e serviços em eletricidade, com carga horária de 40 horas e ementa que inclui, além dos riscos inerentes à eletricidade, noções de prevenção e de combate a incêndio e primeiros socorros." - Legislação Comentada, Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde do Trabalho (2008), Salvador, FIEB-SESI, p. 98.

Sobre as numerações corretas dos anexos na NR-10

Desde a primeira versão desta página eu chamei atenção para o fato de que o texto da norma continha um erro no que diz respeito às referências que fazia à numeração dos anexos. Por exemplo, eu disse a respeito da orientação sobre as zonas controladas e de risco (item 10.7.7):

“A edição da NR-10 disponível no site do Ministério do Trabalho e Emprego contém um erro nesse item. Na verdade, é o anexo II que traz a definição dos limites da zona de risco. O anexo I é o glossário de termos pertinentes à norma”.

No texto principal da norma o legislador chamava o anexo 2 de “anexo 1”, e o anexo 3 de “anexo 2”, como se houvesse apenas dois anexos ao invés de três. Ao que tudo indica, o responsável pela edição final do texto se confundiu e fez uso de dois critérios de referência mutuamente exclusivos. Não ter sido o glossário precedido do título “Anexo I” pode ter sido a causa dessa confusão.

Devido a isso, quando eu citava os trechos da norma que faziam referência aos anexos, eu já os apresentava com as numerações corretas. Mas, visto que os textos que tratam da norma não procediam assim e alguns leitores me questionaram porque as minhas numerações diferiam daquelas vistas na norma, resolvi alterar o meu texto e me referir a elas da maneira errônea costumeiramente vista.

No entanto, voltei agora a me referir às numerações dos anexos como eu fazia antes. A razão é que saiu uma Portaria do Ministério do Trabalho e Previdência Social corrigindo as referências errôneas que havia no texto da NR-10. É a Portaria n.º 509, de 29 de abril de 2016. Os itens da norma alterados por essa Portaria são os seguintes: 10.5.1 (letra “e”), 10.6.1.1, 10.6.2, 10.7.2, 10.7.7, 10.8.8.1 e 10.11.5.

Essa correção feita pela Portaria é mais estrutural do que propriamente de conteúdo. Mas há outros pontos da norma que podem ser melhorados. Conforme visto no início e em outro texto que escrevi, há determinados trechos da norma que não estão claros e têm levado a erros de interpretação da mesma. Eu já mencionei esse problema para um engenheiro que participou da comissão tripartite que elaborou a NR-10, mas, até agora, não houve nenhuma revisão que contemplasse os referidos pontos.

Esta página é parte integrante da apostila sobre NR-10 de minha autoria, utilizada nos Treinamentos de Segurança.

 

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