DUALIDADE ONDA-PARTÍCULA E A PROBABILIDADE QUÂNTICA

O que você consegue ver no quadro acima? Obviamente, ao que parece é uma mulher despida e sentada. Esta obra foi pintada pelo francês Georges Seurat. A técnica que ele usou se chama neo-impressionismo. Nesse tipo de pintura, as cores não são formadas na tela, mas na retina do expectador. Se a tela for observada de perto, ela não passa de vários pontinhos amontoados e aparentemente caóticos.

De maneira análoga, os fótons são partículas de luz, ou seja, muitos "pontinhos". Mas quando eles trabalham em conjunto têm um comportamento ondulatório. A esse fenômeno os físicos dão o nome de "dualidade onda-partícula". Ou seja, a luz se comporta simultaneamente como onda e partícula, de acordo com a maneira que é observada.

É importante conhecer os conceitos acima antes de apresentar uma famosa experiência que mostra o estranho comportamento das partículas no universo microscópico. A física quântica se dedica a estudar tais fenômenos.

Imagine um lançador de bolinhas de chumbo acertando um quadro negro, mas tendo como obstáculo uma chapa com uma fenda única. Qual seria a imagem formada pelo impacto no anteparo? Naturalmente, com os impactos, o quadro ficaria marcado com uma coluna única, conforme mostram as ilustrações abaixo.

E se, ao invés de haver uma fenda, a chapa tivesse duas fendas? Que imagem se formaria no anteparo? É lógico que a tendência seria duas colunas serem formadas, devido à influência das duas fendas.

Se a mesma experiência for repetida em uma piscina, com ondas ao invés de bolinhas, a crista da onda atingirá sempre um mesmo trecho do anteparo, de maneira semelhante às bolinhas.


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Caso o obstáculo tenha duas fendas ao invés de uma só, acontecerá algo diferente. A onda se transformará em duas e interferirão uma na outra, produzindo no anteparo várias "marcações", ao invés de uma só. Esse modelo é chamado de modelo de interferência.


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Pois bem, agora é preciso sair do mundo macroscópico e entrar no diminuto mundo quântico das partículas. Os cientistas repetiram os mesmos procedimentos descritos acima, lançando, ao invés de bolinhas, um feixe com várias partículas fotônicas. Primeiramente, colocaram um obstáculo com uma fenda apenas. O resultado ocorreu conforme o esperado, uma coluna apenas se formou no anteparo.

Em seguida, foi colocado um obstáculo com duas fendas. Olhe só qual foi o resultado:

Um modelo de interferência foi formado no anteparo! Os físicos ficaram surpresos com esse resultado, pois quando fizeram essa experiência pela primeira vez eles esperavam que apenas duas franjas se formassem. No entanto, surgiram várias, como se as partículas estivessem se comportando como ondas que interferem entre si.

Visto que o feixe era composto por muitas partículas, os cientistas imaginaram que elas estavam se chocando umas nas outras, causando interferência entre si, depois que passavam pelas duas fendas. Mas para terem certeza, repetiram o procedimento lançando as partículas uma de cada vez. Assim, não haveria possibilidade de interferência e duas colunas poderiam ser formadas. No entanto, após um tempo atirando fóton por fóton o mesmo modelo de interferência começou a se formar!

O resultado acima deixou os cientistas ainda mais perplexos. Estaria uma única partícula interferindo em si mesma? Para que isso acontecesse seria necessário que antes de passar pelas fendas a partícula se transformasse em duas para que pudesse interferir consigo mesma. As implicações físicas e filosóficas dessa possibilidade deixaram os físicos incomodados, pois significaria dizer que uma única partícula poderia estar em dois lugares ao mesmo tempo! Por isso, preferiram esquecer essa idéia e achar uma outra justificativa. Estavam convencidos que a partícula só passa realmente por uma única fenda.

A explicação que os físicos encontraram para esse comportamento peculiar é que as partículas de fótons não são bolinhas de chumbo do mundo macroscópico. Fótons são fótons e têm um comportamento típico de sua natureza. Surgir um modelo de interferência, semelhante ao das ondas, seria então uma mera coincidência...

A maneira que os fótons se comportam pode ser determinada por um cálculo de probabilidade com resultados muito precisos. Essa maneira de estudar o assunto fez surgir uma nova teoria na física moderna - a eletrodinâmica quântica. As franjas que lembram o modelo de interferência seriam, na verdade, as regiões que os fótons têm maior probabilidade de atingir. Para entender esse novo conceito, uma analogia pode ser feita com um jogo de futebol. Imagine que alguém registrasse graficamente com várias cruzinhas, os pontos que a bola de futebol atingiu durante todas as partidas de um campeonato durante o ano. Ao término desse registro, o resultado seria algo parecido com a figura abaixo:

Note a maior concentração em determinadas regiões da trave. Se o mesmo fosse feito com partidas de volibol, ao invés de futebol, o aspecto provável seria o da gravura a seguir:

Note que as possibilidade acima são simplesmente consequencias das regras de cada jogo. Da mesma maneira, no mundo quântico há regras pré-definidas para as partículas atuarem e que resultam em marcações no anteparo que lembram o "modelo de interferência".

Surge um pequeno problema

Mesmo admitindo que o comportamento estatístico das partículas se assemelha ao modelo de interferência entre ondas por uma incrível coincidência, o modelo probabilístico quântico não é totalmente satisfatório por um detalhe, que foi mencionado no documentário "espiritual-científico" chamado "Quem Somos Nós?". Ele informa que os físicos resolveram "espiar" por qual fenda cada partícula realmente passa, quando é lançada uma por vez. Colocaram um sensor para registrar tal informação. Sabe qual foi o resultado?

Ao "perceber" que estava sendo observada, a partícula não criou no anteparo o modelo de interferência, mas sim o modelo que ocorreria no mundo macroscópico, de duas colunas! Para a frustração geral de quem esperava ver o "modelo de interferência" sendo criado diante dos próprios olhos.


Modelo tradicional da fenda dupla, formado quando se
observou a trajetória das partículas lançadas individualmente

Pelo visto, essas incríveis partículas nunca participariam do "Big Brother", pois, ao que parece, elas não "gostam" de serem observadas e preferem "viver" sem serem incomodadas no seu mundo bizarro... Lembra até aquele desenho animado do operário que encontrou um sapo cantor e, imaginando que ficaria rico com o bicho, ao tentar mostrar para as outras pessoas o talento da criatura a única coisa que o sapo fazia era coaxar, como era de se esperar. Só cantava quando não estava sendo observado, com exceção do dono...

Se essa "câmera" que foi colocada para observar as partículas não interferiu de alguma forma na mecânica quântica, e é de se supor que os cientistas que fizeram esse experimento tiveram o devido cuidado para que isso não ocorresse, essa inconsistência no modelo probabilístico precisa ser esclarecida. O que explicaria esse comportamento inesperado?


2005, Play Arte Distribuidora
Copyright, Lord of the Wind Films

Fontes consultadas:

1 - Física (2000), de Alberto Gaspar, Editora Ática, vol. II, p. 7.

2 - Filme "Quem Somos Nós?" (2005), Play Arte Distribuidora.

Créditos das imagens:

1 - Física (2000), de Alberto Gaspar, Editora Ática, vol. II, p. 7. [Quadro impressionista e redes de futebol e volibol]

2 - Filme "Quem Somos Nós?" (2005), Play Arte Distribuidora. [Imagens restantes]

 

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